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O sonho de Casamento Às Cegas

  • contatoelisamaia
  • 8 de dez. de 2021
  • 5 min de leitura

(Texto originalmente postado na minha conta no Medium no dia 21 de outubro de 2021).


Tava pensando sobre a série Casamento Às Cegas Brasil, recém lançada pela Netflix (viciante, horrível, maravilhosa), sobre como acho maluco aquelas jovens mulheres, quase todas aparentemente bem livres e independentes, falando que sonham a vida toda com o casamento e se emocionando tanto, por exemplo, com a escolha do vestido de noiva (tem uma delas que falou que só se convenceu do sim na hora que escolheu o tal vestido).


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© Instagram, @thiagorochanz


Assistir essa série me fez pensar como casar nunca foi um sonho meu. E olha, eu tive realmente que olhar pra trás e me esforçar pra lembrar que eu nunca sonhei com vestido, véu, grinalda, boy vestido de terno e gravata.


Teve algum lugar em mim que pulou direto pra parte em que eu ia fazer faculdade, que eu teria independência financeira, mas que naturalmente encontraria alguém e “me casaria” num clima descontraído, quase numa não-cerimônia de casamento. Hoje percebo que era isso: eu achava que casar era natural e que em algum momento eu casaria. Mas já adolescente eu olhava pros carinhas ao meu redor e sentia que ninguém ali estava à “minha altura”, achava todo mundo mediano, mesmo me interessando por alguns. No fundo, eu já tinha uma certa aversão a uma vida padrão, igual a todas que eu via ao meu redor.


Tem o fato também de que eu nasci e cresci numa família cristã evangélica, em que todos meio que se casavam com alguém da igreja. Meus pais se conheceram na igreja, casaram nessa igreja. Então meu destino mais previsível seria isso: me interessar, namorar, casar com alguém da igreja. A real é que, que eu me lembre, só fiquei a fim de um cara que nem era exatamente da mesma igreja que a minha, mas da igreja da minha avó, que eu ia sempre. Ele era filho de pais que tinham mais grana, então ele era mais articulado, falava inglês, já fazia faculdade, já tinha um emprego e era guitarrista (músicos, meu pior fraco kkkk). Ele tinha uns 19 anos, eu acho. Eu inclusive falei pra ele um dia que tava interessada e ele falou pra gente orar kkkk… Bom, pra mim já foi um fora. Eu tinha uns 18 anos e já tava pulando fora da igreja. Depois disso mais vi graça nem na igreja, nem em ninguém de lá.


Pensando também no casamento dos meus pais, eles em alguma medida podiam ser uma referência pra mim, mas no fundo (e aqui faço uma confissão, porque talvez nunca tenha verbalizado isso) eu não queria nem um pouco um casamento igual dos meus pais. Minha mãe se casou aos 18 anos, não tinha nem o ensino médio concluído, teve três filhos antes disso e o quarto veio logo depois. Como filha mais velha, a coisa que eu mais ouvi da minha mãe era que ela não queria nenhuma ‘piloto de fogão’ (pois era assim que ela se via naquela época), que era muito perigoso namorar na adolescência porque os hormônios estavam uma loucura e que se a gente engravidasse cedo “acabaria com a nossa vida”, que a gente tinha mais era que estudar. É, definitivamente não tinha nada de romântico ou mágico que eu pudesse querer pra mim do casamento dos meus pais, apesar de todo o amor, cuidado, entrega e investimento deles em mim e nos e meus irmãos. E talvez até fosse isso que já naquela época, sem saber exatamente eu sacava: aquela entrega, naquele casamento, era um caminho total oposto na busca por independência, por sucesso, e eu silenciosamente não queria aquilo.


Então quando eu penso nos meus sonhos na adolescência e início da vida adulta, lembro que eles eram sobre ser livre, ter independência financeira, viajar, fazer música, ter banda e sim, ter um namorado, ser amada, ser desejada, mas não ter uma vida padrão média. Eu nunca quis isso pra mim. E pensando hoje, mesmo me sentindo muitas vezes sozinha ou tendo sofrido porque alguém que eu gostava não havia correspondido ao meu interesse, eu nunca me esforcei muito pra estar num relacionamento, eu tava sempre focada na minha corrida pessoal em ser de alguma forma ‘especial’, independente, livre.


Inclusive quando eu comecei a cantar em banda e percebia que as pessoas e principalmente os homens me colocavam num pedestal, achava que alguém especial viria pra mim enxergando exatamente o quanto eu era ‘especial, talentosa, determinada’. O doido é que hoje eu sei que aparentemente isso é exatamente o que em muitas situações afastou de mim a possibilidade de estar em relacionamentos: estar numa posição de destaque, “ser especial” em alguma medida, intimidava os caras. Intimida até hoje.


Eu continuo não querendo casar. Aliás, as cerimônias de casamento sempre me pareceram cafonas, barrocas. E hoje sou ateia. Não me sentiria confortável numa performance religiosa pra validar meu relacionamento. Porém acharia total plausível um contrato que estabelecesse os parâmetros de uma vida a dois, caso eu tivesse uma. Cartório e união civil estável estão aí pra isso.



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Foto do meu Instagram secreto (kk) @amornemexiste


No último ano, morando sozinha e aos 40 anos, cultivo algum conforto na pequena dinâmica diária da minha vida doméstica, sou apegada à ela. Amo receber amigas e amigos e é totalmente plausível receber um amante, mas o casamento na lógica da convivência doméstica a essa altura da minha vida é uma coisa que eu nem sei se eu quero. Corrigindo, sendo franca: eu não quero! Me sinto solitária em muitos momentos? Me sinto! Às vezes sinto que passo tempo demais em silêncio e acho que talvez não seja tão legal assim? Sim! Mas uma das minhas fantasias mais leves e divertidas seria ter um relacionamento com alguém como eu, que gosta de ter o seu espaço e mesmo assim me fizesse me sentir amada e desejada. Esse é meu sonho de relacionamento. Essa é a minha fantasia mais romântica de todas.



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Minha cama, meu reino. Lá do meu instagram oficial @elisamaiamusic


Reconhecer que eu nunca sonhei com um casamento padrão tal qual ele tão ostensivamente é apresentado nas nossas vidas, principalmente na norma hétero, como única possibilidade de “validar” um relacionamento, me ajudou a perceber como às vezes a gente se impõe sofrimento por não atender o padrão, não cumprir um “destino” que dizem pra gente que é o “natural”. A estrutura à que a cultura monogâmica e a heteronormatividade servem é tão pesada, é tão arraigada a como todos nós pensamos e agimos, que nos fazem sofrer mesmo quando nunca nem desejamos ou sonhamos com esse destino. Fora que se você é uma corpo ou existência fora do padrão, quase nunca você tá no controle disso. É opressivo de muitas maneiras e faz com que muitas pessoas, mulheres em sua maioria, aceite estar em situações ou relacionamentos tóxicos ou abusivos em nome do “sonho do casamento”.


Acho que cedo percebi que valia mais a pena me escolher, mesmo quando estive em relacionamentos, mesmo quando não “fui escolhida”. Eu sempre consegui me escolher e continuar sonhando com liberdade, com independência, mesmo que às vezes duvidasse e me pegasse me perguntando que escolhas no meio do caminho eu tinha feito pra estar só. Sinto que não fiz nada de errado, inclusive porque faz tempo que saquei que relacionamentos amorosos-sexuais não são toda a minha vida, são só uma parte dela.


Enfim, nunca sonhei em me casar!





 
 
 

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